terça-feira, 29 de setembro de 2009

Adam e Chris.


A estrada não tinha muitas curvas e a paisagem raramente mudava. O tempo passava e os quilômetros se seguiam, mas de um lado e de outro só se via campos verdes com pouquíssimas árvores. Vez por outra aparecia um lago para acrescentar um breve detalhe ao lugar. O Porsche 911 conversível amarelo corria a quase 80 km/h. Não era um modelo novo, mas também não era dos mais antigos. O dono cuidava bem dele e isso fazia do carro um belo veículo de se observar e agradável para se andar.

Com a mão direita no volante e o braço esquerdo meio do lado de fora da janela, um homem de verdes guiava o automóvel. Não era um verde comum, e sim de uma tonalidade forte, como se fosse pintado por tinta mesmo. Passou a mão livre na testa e depois na barba por fazer. Há quatro dias não aparava a barba e o que estava prestes a fazer não lhe saía da cabeça. Olhou para o lado e riu rapidamente, mas de forma verdadeira e sincera.

No banco do passageiro sentava outro homem, de idade talvez igual a do primeiro, quase trinta. Usava óculos escuros que lhe davam um charme singular. Os lábios finos não se aquietavam, mas também não diziam nada. Não parava de morder os lábios um minuto sequer. Era a mania da qual jamais conseguira se livrar. Retribuiu o sorriso do outro e passou, carinhosamente, a mão sobre o ombro daquele.

Adam e Chris.

Adam não parava de tamborilar os dedos sobre a direção. Não falavam nada há quase meia hora. A paisagem monótona parecia querer expulsar o porsche dali o quanto antes. Chris, silencioso como nunca, fazia de tudo para não ficar parado como estátua: mexia os dedos, tirava os óculos escuros e recolocava-os novamente, limpava uma inexistente poeira no painel do carro, balançava a cabeça cantando mentalmente alguma música desenterrada de suas memórias.

Os campos verdes, uma árvore aqui, outra quinhentos metros depois. Aves voando três quilômetros a frente. Nenhum carro passando por eles, nenhuma pessoa, nenhuma casa de campo, nenhuma fazenda, nem animais no pasto. Vida escassa e silenciosa.

- Tem certeza que quer fazer isso? – perguntou Chris, finalmente cortando o silêncio que corroia o pequeno espaço dentro do porsche.

Adam pareceu diminuir a velocidade do carro. Tamborilou novamente os dedos sobre a direção.

- Eu preciso. Você sabe disso, eu preciso. Nós precisamos – respondeu sem olhar para Chris.

Chris esticou-se no banco e beijou o braço de Adam. Olhou o homem que ali estava e lembrou de muitas coisas pelas quais passaram. As memórias vieram-lhe em poucos segundos como flashes confusos, mas que ele conseguiu entender muito bem.

Adam diminuiu bruscamente a velocidade do porsche. O carro parou em pouquíssimos segundos depois. Mesmo usando cinto de segurança, Chris segurou-se na porta e no painel do veículo para tentar diminuir o efeito da inércia. Olhou assustado para Adam, perguntando, mais para si mesmo do que para o outro, porque estavam parando ali no meio do nada e daquela forma tão brusca.

Tirando o cinto de segurança de ambos, Adam olhou fixamente para o assustado Chris. Puxou os óculos escuros que escondiam um par de olhos castanho claros que podiam expressar todo o sentimento do mundo quando queriam.

- Por favor... Eu... Eu só quero que você saiba que eu te amo. Que eu te amo mais do que tudo nessa merda de mundo.

A expressão de Chris mudou rapidamente de forma que só ele sabia fazer. Aproximou-se de Adam e segurou-lhe as duas mãos entre as suas próprias, acariciando-as.

- Você sabe que eu também te amo. Nada do que aconteça lá vai fazer com que eu deixe de sentir o que sinto.

- Chris, eu...

Chris interrompeu Adam com um chiado quase inaudível. Levou a mão direita até o rosto do homem que lhe dizia aquelas palavras. Adorava passar os dedos levemente sobre a barba por fazer de Adam. Aproximou-se ainda mais e disse, a menos de três dedos do rosto dele:

- Não precisa dizer nada. Lembra do que eu prometi, né? Apesar de já ter mais de quinze anos, essa promessa ainda é válida. Agora, vamos continuar. Viajamos centenas de quilômetros e não vamos voltar atrás, Adam, porque eu sei que se voltarmos, você nunca mais virá até Rio Azul novamente. Nem mesmo por um milagre. Você está decidido, não está?

Adam apenas balançou a cabeça, respondendo afirmativamente.

Sim, estava decidido. E sim, lembrava da promessa de Chris quando ainda eram apenas adolescentes. Sabia que faltava pouco tempo para chegar à pequena cidade de Rio Azul. As memórias da época em que viveu lá voltavam como um turbilhão de emoções incontroláveis, como o mais puro instinto selvagem.


- Marcel.

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